Doze dias depois de perder a democracia sob a treva de uma ditadura sanguinária, o Chile perdeu Pablo Neruda, uma de suas vozes mais sábias e uma de suas almas gentis. Levou-o o câncer que lhe roía os ossos, mas, antes dele, a tristeza por ver o seu povo enxovalhado. Era setembro de 1973 numa Santiago gelada, onde se esgueirava pelas ruas policiadas um dos olhares mais atentos do jornalismo brasileiro: o premiado fotógrafo Evandro Teixeira e sua inseparável Leica.
Do Estádio Nacional, masmorra de milhares de chilenos, ao fumegante palácio La Moneda, túmulo da liberdade, e ao necrotério da capital, Evandro tornou-se um dos poucos fotógrafos do mundo a documentar os horrores que marcaram a ditadura chilena já em seus primeiros passos. Não era suficiente, porém, e Evandro embrenhou-se por aqueles corredores de morte até registrar com sua câmera o que, nas ruas, só se cochichava como boato: Neruda estava morto. Dessa forma, tornou-se o único fotógrafo em todo o mundo a acompanhar todas as estações do calvário a que os militares submeteram a família do grande poeta.
Quando a família chegou em casa, tendo vindo do necrotério com o corpo, encontrou-a destruída, o jardim revolto e enlameado – o caixão teve ser carregado sobre pranchas. Em seguida, as imagens mostram o cortejo que levou Neruda ao cemitério: inicialmente pequeno, acompanhado por um cão solitário, ele vai crescendo até tornar-se a multidão que o carregou ao túmulo como um vencedor.
Esse trabalho monumental de Evandro Teixeira, do qual NoMínimo tirou o presente ensaio, está imortalizado no livro “Vou viver”, edição patrocinada pela Prefeitura do Rio de Janeiro. O livro foi dado de presente ao presidente do Chile, Ricardo Lagos, que visitou a cidade em novembro.
Fonte: nominimo.com.br - Xico Vargas
Um comentário:
Best regards from NY!
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