José Oswald de Andrade Souza (11 de janeiro de 1890 - 22 de outubro de 1954), escritor, ensaísta e dramaturgo brasileiro.
Foi um dos promotores da Semana de Arte Moderna de 1922 em São Paulo, tornando-se um dos grandes nomes do modernismo literário brasileiro. Foi considerado pela crítica como o elemento mais rebelde do grupo.
O papel de Oswald no Modernismo Brasileiro
Um dos mais importantes introdutores do Modernismo no Brasil, foi o autor de dois incontornáveis manifestos modernistas: O Manifesto da Poesia Pau Brasil e o Manifesto Antropófago.
Indissociável da figura de Mário de Andrade, ambos os autores funcionaram como um dínamo na introdução e experimentação do movimento, unidos por uma profunda amizade que durou muito tempo.
Embora menos profundo e analítico, Oswald de Andrade era muito mais extrovertido e provocador que o seu colega modernista. Nesse aspecto não só os seus escritos como as suas aparições públicas serviram para moldar o ambiente modernista da década de 1920 e de 1930.
Foi um dos interventores na Semana da Arte Moderna de 1922. Essa semana teve uma função simbólica importante na identidade cultural brasileira. Por um lado celebrava-se um século da independência política do país colonizador Portugal, e por outro consequentemente, havia uma necessidade de se definir o que era a cultura brasileira, o que era o sentir brasileiro, quais os seus modos de expressão próprios. No fundo procurava-se aquilo que Herder definiu como alma nacional (volksgeist). Esta necessidade de definição do espírito de um povo era contrabalançada, e nisso o modernismo brasileiro vai a par com as vanguardas europeias do princípio do século, por uma abertura cosmopolita ao mundo.
Nos anos vinte Oswald voltou-se contra as formas cultas e convencionais da arte. Fossem elas o romance de idéias, o teatro de tese, o naturalismo, o realismo, o racionalismo e o parnasianismo (por exemplo Olavo Bilac). Interessaram-lhe, sobretudo, as formas de expressão ditas ingénuas, ou o abstracionismo, a recuperação de elementos locais, aliados ao progresso da técnica, um misto de dorme néne que o bicho vem pegá e de equações.
Num primeiro momento Oswald propôs uma carnavalização de todos os valores, na atitude típica da vanguarda iconoclasta, que depois refundiu para a expressão de revolução antropofágica.
Foi com surpresa e satisfação que Oswald de Andrade descobriu, na sua estada em Paris na época do Futurismo e especialmente do Cubismo, que os elementos de culturas até aí consideradas como menores, como a Africana ou a Polinésia, estavam a ser integrados na arte mais avançada. Assim a arte da Europa industrial era renovada com uma revisitação a outras culturas e expressões de outros povos. Oswald apercebeu-se que o Brasil e toda a sua multiplicidade cultural, desde as variadas culturas autóctones dos índios até à cultura negra, eram uma mais valia e que com elas se podia construir uma identidade e renovar as letras e as artes. Tenta fundir, pôr ao mesmo nível, os elementos da cultura popular e erudita, fazendo tábula rasa das categorias que T. S. Eliot iria cunhar como sendo upper culture e lower culture. Sugeriu ainda que as normas académicas da fala fossem abolidas o que exprimiu na sua poesia.
O Manifesto da Poesia Pau Brasil (1924)
O manifesto da poesia Pau-Brasil é do mesmo ano que o Manifesto Surrealista de André Breton, o que reforça a tese de que o Brasil estava a acompanhar plenamente o movimento das vanguardas mundiais. Tinha deixado definitivamente de ser uma forma de expressão pós-portuguesa para se afirmar plena e autonomamente. Neste manifesto Oswald defende uma poesia que seja ingênua, mas ingênua no sentido de não contaminada por formas preestabelecidas de pensar e fazer arte. “Poetas. Sem reminiscências livrescas. Sem pesquisa etimológica. Sem ontologia.”
O manifesto desenvolve-se num tom de paródia e de festa, de prosa poética pautada com frases aforísticas. Nele se expressa que o Brasil passe a ser uma cultura de exportação, à semelhança do que foi o produto pau-brasil, que a sua poesia seja um produto cultural que já não deve nada à cultura europeia e que antes pelo contrário pode vir a influenciar esta. Oswald defende uma poética espontânea e original, as formas de arte estão dominadas pelo espírito da imitação, o naturalismo era uma cópia balofa. “Só não se inventou a máquina de fazer versos- já havia o poeta parnasiano”. Afirma assim uma poesia que tem que ser revolucionária. “O trabalho contra o detalhe naturalista- pela síntese, contra a morbidez romântica. - pelo equilíbrio geômetra, e pelo acabamento técnico, contra a cópia, pela invenção e pela surpresa”.
Talvez não seja muito errado afirmar que este manifesto poderia ser considerado como um futurismo tropicalista. “temos a base dupla e presente-. a floresta e a escola. A raça crédula e dualista e a geometria, a álgebra e a química logo depois da mamadeira e do chá de erva doce.”
Manifesto Antropófago (1928)
Foi publicado no primeiro exemplar da Revista de Antropofagia. Os exemplares desta publicação eram numerados como primeira dentição, segunda dentição, etc.
Este Manifesto constitui-se numa síntese de alguns pensamentos do autor sobre o Modernismo Brasileiro. Inspirou-se explícitamente em Marx, em Freud, Breton, Montaigne e Rousseau e atacava explícitamente a missionação, a herança portuguesa e o padre António Vieira: Antes de os portugueses descobrirem o Brasil, o Brasil tinha descoberto a felicidade; Contra Goethe (que simboliza a cultura clássica européia). Neste sentido, assina o manifesto como tendo sido escrito em Piratininga (nome indígena para a planície de onde viria a surgir a cidade de São Paulo), datando-o esclarecedoramente como ano 374, da Deglutição do Bispo Sardinha, o que denota uma recusa radical, simbólica e humorísticamente, do calendário gregoriano vigente.
Há várias idéias que estão implícitas neste manifesto, sendo de lamentar que o seu autor não tivesse o espírito sistemático e mais profundo do seu amigo Mário de Andrade para as ter explanado de uma maneira mais substantiva. Uma é conhecida da antropologia e tem a ver com o papel simbólico do canibalismo nas sociedades tribais/tradicionais. O canibal nunca come um ser humano por nutrição, mas sim sempre para incluir em si as qualidades do inimigo ou de alguém. Assim o canibalismo é interpretado como uma forma de veneração do inimigo. Se o inimigo tem valor então tem interesse para ser comido porque assim o canibal torna-se mais forte. Oswald actualiza este conceito no fundo expressando que a cultura brasileira é mais forte, é colonizada pelo europeu mas digere o europeu e assim torna-se superior a ele: Perguntei a um homem o que era o Direito. Ele me respondeu que era a garantia do exercício da possibilidade. Esse homem chamava-se Galli Matias. Comi-o.
Outra idéia avançada é a de que a maior revolução de todas vai se realizar no Brasil: Queremos a revolução Caraíba.
Outra idéia é a de que o Brasil, simbolizado pelo índio, absorve o estrangeiro, o elemento estranho a si, e torna-o carne da sua carne, canibaliza-o. Oswald recusa as religiões do meridiano que são aquelas de origem oriental e semita que deram origem ao cristianismo. Sendo a favor das religiões indígenas, com a sua relação directa com as forças cósmicas.
O manifesto insiste muito nas ideias de Totem e Tabu, expressas em um trabalho de Freud de 1912. Segundo Freud o Pai da tribo teria sido morto e comido pelos filhos e posteriormente divinizado. Tornado Totem e por isso mesmo sagrado, consequentemente criaram-se interdições à sua volta.
Citando o Manifesto: Antropofagia. A transformação permanente do Tabu em totem. A antropofagia segundo Oswald é uma inversão do mito do bom selvagem de Rousseu, que era puro, inocente, edénico. O índio passa a ser mau e esperto, porque canibaliza o estrangeiro, digere-o, torna-o parte da sua carne. Assim o Brasil seria um país canibal. O que é um ponto de vista interessante porque subverte a relação colonizador/(activo)/colonizado(passivo). O colonizado digere o colonizador. Ou seja, não é a cultura ocidental, portuguesa, européia, branca, que ocupa o Brasil, mas é o índio que digere tudo o que lhe chega. E ao digerir e absorver as qualidades dos estrangeiros fica melhor, mais forte e torna-se no brasileiro.
Assim o Manifesto Antropófago, embora seja nacionalista não é xenófobo, antes pelo contrário é xenofágico: Só me interessa o que não é meu. Lei do homem. Lei do antropófago.
Obras principais
1924: Memórias sentimentais de João Miramar (romance)
1925: Pau-brasil (poesia)
1937: O rei da vela (teatro)
1928: Manifesto antropófago
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