10 de dezembro de 2005

EU QUERO MOCOTÓ!

Se você é gourmet, deve estar meio de saco cheio com o atual estado da culinária brasileira. Mas como é que você fala uma coisa dessas, sua besta? Nos últimos dez anos aconteceu uma verdadeira revolução rangogastronômica no país: milhares de produtos de qualidade começaram a ser produzidos, publicações e guias especializados surgiram, milhares de cursos foram dados, centenas de restaurantes bons apareceram, milhares de profissionais se formaram. E isso sem falar na invasão dos importados, que, assim com no caso dos automóveis brasileiros, fizeram a qualidade da nossa comida melhorar. Mas chegou a hora de decretar o fim da Era Collor na comida brasileira! Na boa, se hoje você for a um restaurante chique do Rio ou de São Paulo, aposto que vai encontrar no menu vários pratos de risotto, ceviche, maigrets de canard, terrines, confits, veloutés, emulsões de endívias caramelizadas, trufas e o onipresente foie gras. E, com certeza, não vai achar nenhuma rabada com agrião, mocotó, camarão com chuchu, dobradinha, nem mesmo uma singela carne assada! Por falar nisso, os seres humanos se dividem entre os que preferem carne assada com recheio de cenoura e os que a preferem com recheio de lingüiça. Mas isso é tema de um outro artigo.Nesse ponto, nossa Gula - a Playboy dos glutões (assim como a Playboy, Gula também é cheia de coisas que a gente nunca vai comer na vida) - vem a cada número tentando fazer ver a nossos comilões as delícias e qualidades de nossa cozinha, aquela da Dona Benta, exatamente, a nossa boa e velha comidinha brasileira velha de guerra que nunca deixou de ser a preferida do povão. Mas não tem jeito, nossa vocação para macaco de imitação, nossa eterna inferioridade diante dos gringos é muito forte. Se você está do meu lado, achará que é muito fácil superar essa fase infantil e emergente da nossa gastronomia canarinho. A primeira coisa que um gourmet brasileiro precisa fazer, antes de mais nada, é ser brasileiro. Eu conheço gente que chora ao lembrar de uma andouillette que comeu na França, mas jamais teria coragem de provar uma buchada em Caruaru, embora essas iguarias sejam feitas com as mesmas coisas: intestinos de animais. Ninguém está falando em represália ou qualquer boicote às comidas estrangeiras que vêm de fora para dentro (no bom sentido, é claro) da nossa culinária. Não pensem que eu sou uma espécie de Arriando Suassunga, quer dizer, de Ariano Suassuna alimentar. Não existe culinária ruim, existe culinária mal comida. Prestem atenção em minhas palavras proféticas: nossos chefs nunca atingirão a maioridade gastronômica se não começarem a trabalhar seriamente em cima de nossos clássicos, porque, como diz minha mulher aqui em casa, você é o que você come.
Hubert Aranha é membro do Casseta e Planeta (com trocadilho, por favor).

Um comentário:

Anônimo disse...

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