Mas para que histórias como a do Café Nice não se dissolvam da memória com o passar dos anos, Zé Octávio, vai eternizá-las no livro “Memória afetiva dos botequins cariocas”, ainda sem data para ser lançado. A publicação dedicará uma página aos principais bares e botecos que, de alguma forma, contribuíram para o desenvolvimento cultural do Rio. Na relação, só para citar alguns, estão Zicartola, Jangadeiros, Taberna da Glória, Zepellin, Sovaco de Cobra, Antigo Capela, Real Astoria, Luna Bar, Antonio's e Casa Pardellas.
— A idéia é transmitir a atmosfera da boemia carioca em diferentes épocas, criar um documento que revele a influência cultural do botequim no inconsciente coletivo carioca — resume Zé Octávio, que também é jornalista.
Conversa com Tom Jobim
Entusiasta do projeto, o compositor Moacyr Luz lembra com nostalgia do dia em que encontrou Tom Jobim, na esquina das ruas Santa Luzia e México. Ali funcionava a Casa Pardellas, uma espécie de quitanda, mas que lá nos fundos, lugar que era impossível se ver da calçada, abrigava um botequim, daqueles bem tradicionais.
— Entrei naquele lugar despretensiosamente e lá estava o Tom Jobim, bebendo sozinho. Foram duas horas de papo, sem interrupções — orgulha-se Moacyr Luz. — Isso foi em 1981, tinha 23 anos, mas o momento está eternizado na lembrança.
Para Moacyr Luz, lugares como a Casa Pardellas não podem ser esquecidos:
— O projeto do livro é genial. Os bares de hoje não têm identidade. As cadeiras de plástico e os letreiros padronizados de distribuidoras de bebidas em nada lembram o ambiente aconchegante dos antigos botecos, com suas cadeiras de ripa, balcão de mármore e o garçom te chamando pelo nome. Os donos de bar tinham orgulho das luzes de néon que ostentavam.
Habitué dos bares de intelectuais como Zeppelin e Jangadeiros, o poeta Ferreira Gullar recorda da época em que não era preciso marcar hora nem local para estar com os amigos:
— Era só chegar e lá estavam eles. Os bares fazem parte da vida da cidade, é um local que reúne pessoas interessantes, com bom papo. E no Rio botequins envolvem a história da Música Popular Brasileira, da poesia brasileira, do cartunismo.
Das lembranças mais aguçadas do poeta estão os bate-bocas e brigas protagonizados por Roniquito, figura lendária da Ipanema dos anos 60:
— Era divertido quando estávamos nos bares e chegava alguém que não costumava freqüentá-los. Roniquito era muito engraçado, inteligente, mas também muito cruel com essas pessoas, dizendo que não deveriam estar ali, que não era lugar para elas. Umas se sentiam constrangidas e iam embora, outras partiam para a briga.
Samba e comida no Zicartola
Fundado por Cartola, o Zicartola teve uma vida curta, mas gloriosa na década de 60. Funcionou por dois anos (de 63 a 65), amparado em duas vertentes: a boa música, comandada pelo compositor mangueirense, e a boa comida, liderada pela mulher dele, Dona Zica. No número 53 da Rua da Carioca, a memória do Zicartola mantém-se viva numa placa afixada onde hoje funciona o Pilão de Pedra, um restaurante a quilo. Na parede, há o registro de que foi ali que Paulinho da Viola ganhou seu primeiro cachê.
E como falar em botecos sem lembrar da Lapa, reduto da malandragem carioca? Uma das histórias trágicas do livro de Zé Octávio é que bem ali, no Antigo Capela, o compositor Geraldo Moreira morreu durante um briga com João Francisco dos Santos, o Madame Satã.
Segundo o jornalista, foram diversos os motivos que o levaram a contar a história dos bares, mas o maior deles foi a falta de consciência do valor histórico e cultural da cidade:
— Tenho saudade de uma época que não vivi (Zé Octávio tem 34 anos) e que merece ser eternizada.
Escrito por Fernanda Freitas, em O Globo Online
Um comentário:
Os botecos do Rio são mais charmosos primeiro por que tem toda uma turma que os frequentava, o pessoal da Bossa Nova e outra é o ritmo também tipicamente brasileiro, o samba!
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