13 de outubro de 2005

ARI BARROSO - Comida em verso e música

Como bom boêmio, o compositor Ari Barroso apreciava os petiscos dos botequins cariocas, onde era freqüentador assíduo, saboreava galinha frita com as mãos e bebia whisky
Além da fama de genial compositor, Ari Barroso (1903-1964) é conhecido por ter sido um dos maiores farristas do seu tempo. Bom de copo, irradiava alegria entre os boêmios cariocas. Na mesa com os amigos, era dos mais falantes, sempre com ótimas tiradas e humor às vezes irônico. Ari chegava ao entardecer aos bares, com uma entusiasmada turma composta de gente como Vinicius de Moraes, Antônio Maria, Sérgio Porto, entre muitos outros. Naturalmente, bem acompanhado de uma generosa dose de whisky, servida com pedras de gelo e um pouco d'água. Muitas vezes optava pela cerveja. "Ele era o dono da mesa, muito espirituoso e engraçado", define o jornalista e escritor Sérgio Cabral Santos, autor da mais completa biografia do músico, No Tempo de Ari Barroso (Lumiar Editora, Rio de Janeiro, 1993).

Deliciava-se com os típicos pratos de botequim. Um dos seus favoritos, como relata Cabral, era a galinha frita do tradicional bar Cervantes, na Avenida Prado Júnior, em Copacabana. "Gostava de comer a galinha com a mão", lembra o escritor. Aberto em 1955, o Cervantes ainda é um dos lugares mais procurados na alta madrugada para tomar chope e saborear, principalmente, seu antológico sanduíche de pernil com abacaxi, de sabor único. A galinha da época de Ari continua a figurar no cardápio e o segredo, segundo a equipe do Cervantes, é cozinhá-la antes e fritá-la levemente na hora de ir à mesa. O que a torna mais macia e menos gordurosa.

Outro boteco memorável na vida do compositor foi o Villarino, conhecido como o bar da bossa nova, no Centro do Rio de Janeiro. Dizem que foi ali o memorável encontro de Vinicius de Moraes e Tom Jobim. O primeiro de uma série histórica.
O espanhol Antônio Vasquez, hoje proprietário do bar, era garçom na época e serviu muito a mesa de Ari. "Ele chegava às 18 horas em ponto", conta. Esse horário fez Cabral chamar os encontros de "boemia vespertina". Segundo o espanhol, para acompanhar seu whisky White Horse, o compositor saboreava finas fatias de presunto cozido, servidas com pão preto e uma pasta de queijo roquefort. "Mas bebia mais que comia", diz Vasquez, de 71 anos. "Eles vinham todos os dias. Ficavam até as 21 horas e depois iam embora.

O Ari era muito alegre, cantava, dançava e tomava de três a quatro doses de whisky por noite", conta. "Antes de partir, sempre encomendava um pacotinho de frutas para levar para casa."Sim, eram seu encanto. Apreciava as frutas, principalmente as mangas de sua terra, Ubá, em Minas Gerais. "Era louco por elas", lembra Cabral. O compositor chegou ao Rio com 18 anos, para ingressar na Faculdade de Direito do Catete. Jovem do interior, foi tentar a vida na cidade grande. De cara, maravilhou-se com o mar. Ali, Ari fez de tudo um pouco. Foi jornalista, radialista, locutor esportivo. "Ele era um exagerado em tudo o que fazia; um compositor exageradamente bom", derrete-se Cabral. Antes de mais nada, contudo, é o compositor de "Aquarela do Brasil", que fez em uma tarde chuvosa e o tornou famoso no mundo todo.
Falava do Rio e da Bahia com peculiar familiaridade, como se pode ver em "Na Baixa do Sapateiro".
O compositor morou por muitos anos no Leme, na hoje chamada Ladeira Ari Barroso. Naquela casa, oferecia alguns almoços caprichados para amigos e pessoas importantes de passagem pela cidade. Era comum servir feijoada. Na redondeza de sua residência, freqüentava o Fiorentina, restaurante que agora tem sua estátua na porta, para brindar os visitantes com o cliente ilustre. O lugar havia fechado em 1992 e, no ano passado, voltou a funcionar.

Ari adorava tomar suas doses de whisky e contar histórias (nem sempre verdadeiras) nas mesas do bar. O encantamento com o álcool lhe causou uma cirrose. Faleceu num domingo de Carnaval, mas até a morte teve poesia. Seu último suspiro aconteceu quando sua escola favorita, a Império Serrano, desfilava na avenida.


Um comentário:

Anônimo disse...

Só hoje tive tempo de ler este post. Como sempre uma aula, uma magnífica aula.
Parabéns
beijos