5 de novembro de 2005

Tristeza com o meu Rio...


Que o Cristo nos proteja...


Insegurança: toque de recolher
Episódios de violência transformam hábitos do carioca, que antecipa horários de volta para casa e evita se deslocar à noite
Duilo Victor e Ricardo Albuquerque
No manual de sobrevivência da noite do Rio, saber a hora de pedir a saideira se tornou crucial. Entre esticar ou voltar para casa, o carioca vem optando pela segurança e deixa vazios, cada vez mais cedo, bares, restaurantes e boates da Zona Sul. Reduto da boemia, o Baixo Leblon, endereço de pontos consagrados, como a Pizzaria Guanabara, o Jobi e os restaurantes da Rua Dias Ferreira, é o maior exemplo dessa transformação nos hábitos de quem, até bem pouco tempo, orgulhava-se em ver o sol nascer antes de fechar a conta.
Para não deixar de sair, uma das estratégias da boemia é privilegiar a vizinhança. Em vez de atravessar o túnel e chegar ao Leblon, moradores da Barra dão preferência aos bares do bairro. O diagnóstico é de um expert em diversão noturna. Um dos donos do Bar Jobi, o empresário Narciso Rocha também percebeu mudanças na faixa etária dos clientes da noite do Leblon.
- O movimento de moradores da Barra caiu bastante nos últimos quatro anos. Percebo que os mais velhos têm mais medo da violência. Antes era tradição receber pessoas de meia-idade para jantares até tarde. Hoje, quem entra pela madrugada são os mais jovens, que ficam só no chope - conta Rocha, lamentando o fraco movimento depois da meia-noite entre segunda e quarta-feira.
A boemia do meio de semana afetou mais ainda o Bardot, bar e restaurante da Rua Dias Ferreira. A casa não abre mais às segundas e terças-feiras. A gerente Suely Pontes comparou, nos últimos meses, todos os dias a freqüência da noite do Baixo Leblon com os bares do Jardim Oceânico, na Barra. O Leblon tem perdido todas.
- Até minhas amigas que moram na Barra não querem passar a noite na Zona Sul. Têm medo de dirigir pelo Zuzu Angel ou pela Niemeyer. A violência está criando barreiras físicas na cidade que impedem o direito de ir e vir - afirma Suely.
Dois quarteirões antes do Bardot, no Bar Belmonte, a estudante de psicologia Elisa Almeida, 22 anos, contava que desistiu da Barra quando foi vítima, há três meses, da barreira da violência. Eram 22h quando uma amiga da universitária ligou para o celular avisando que um tiroteio interditava o caminho da Barra para a Zona Sul.
- Saía da Barra e fiz um desvio pelo Itanhangá e Alto da Boa Vista para chegar a uma festa na Lagoa. Dei a volta na cidade para fugir do perigo - conta.
Moradora do Leblon, a estudante garante que só sairia à noite para a Barra se usasse uma estratégia cada vez mais freqüente entre suas colegas: dormir na casa de amigas e voltar na manhã seguinte.
Em dia de violência na Rocinha, marcar qualquer evento na Zona Sul é certeza de fracasso, a menos que se tenha idéias mirabolantes. O piloto militar Robson Miranda, 43 anos, diz não ter alterado sua rotina por causa da violência, apesar da preocupação dos pais. No dia do conflito que resultou na morte do traficante Bem-te-vi, um colega de Miranda fretou uma van para trazer amigos da Barra até um restaurante no Leblon.
- O almoço só foi possível com a van. Mesmo assim, houve tensão porque ouvimos tiros quando passávamos em frente ao morro. É absurdo pagar impostos e ter de se prender em casa. Ainda não admito deixar de sair por causa de bandidos - indigna-se o militar, morador da Barra, que na última quinta-feira dividia, com 10 clientes, o balcão e as mesas do Bardot por volta das 22h30.
Na mesma quinta-feira, a agitação tradicional do Baixo Leblon perdia força por volta das 23h. Nesse horário, no bistrô Cafeína Leblon, na Avenida Ataulfo de Paiva, a advogada Andréia Maia, 26 anos, contava que a guerra de traficantes na Rocinha em abril do ano passado marcou a época em que passou a ter medo da violência.
- Ainda não deixei de sair à noite, mas minha mãe e minha tia já desistiram - relata a moradora de São Conrado.
Dividindo mesa com a advogada, o administrador André Albuquerque, 28 anos, morador do Leblon, explica seu novo conceito de diversão noturna: sair pelo bairro ou ficar em casa, depois de alugar algum filme. Por ora, os programas em bairros afastados estão descartados.
Do outro lado da avenida, a Pizzaria Guanabara estava com boa clientela em comparação com a concorrência do bairro. Mas o gerente do estabelecimento, Élcio Pereira, explica que o movimento só se mantém por causa da tradição da pizzaria. Há poucos anos, diz Pereira, a calçada ficava lotada de freqüentadores quase até de manhã.
- Moro em Niterói mas estou sempre na Zona Sul e fico por aqui. Não vou à Barra há muito tempo. Qualquer coisa leva medo às pessoas. Outro dia estava no Túnel Rebouças quando estourou o escapamento de um carro e os motoristas pensaram que se tratava de um tiroteio - conta a jornalista Julia Enne, 24 anos, que estava com o namorado na Pizzaria Guanabara.
Para voltar para casa, Julia ela não pega mais o Rebouças e prefere as pistas do Aterro do Flamengo - caminho mais longo onde, diz ela, sente-se mais segura.

Fonte: Jornal do Brasil - JB On Line

Um comentário:

Saramar disse...

Luiz, bom dia.
Que pena! A cidade maravilhosa, a mais linda do país, a mais importante se ver assim refém dos bandidos, por absoluta irresponsabilidade dos governantes que deixaram a situação chegar a esse ponto.

Beijos